Publicado em 09/12/2005
Na análise funcional de novos genes é muito importante saber a localização subcelular da proteína codificada. Uma das técnicas mais usadas para este fim é a expressão, na célula, de uma proteína quimérica, que resulta da fusão da proteína em questão com a proteína verde fluorescente GFP (Green Fluorescent Protein) proveniente da medusa Aequorea victoria. O resultado da expressão da necessária fusão genética, obtida por recurso à tecnologia de DNA recombinado, numa célula de interesse, pode ser observado por microscopia de fluorescência e assim determinada a sua localização subcelular.
Devido ao enorme impacto deste tipo de abordagem, os cientistas
responsáveis pela descoberta da proteína GFP e pela sua aplicação
generalizada à Biologia Celular foram contemplados em 2008 com o Prémio
Nobel da Química.
Esta técnica de fusão, dita fusão-GFP, com vista à localização subcelular de proteínas codificadas por genes de função desconhecida, é mais um exemplo das possibilidades que são oferecidas pelas abordagens pós-genómicas, visto que requer o conhecimento da sequência de nucleótidos da região codificante do gene cujo produto se pretende localizar.
O exemplo que se apresenta em seguida refere-se à localização da proteína codificada pelo gene FLR1 de levedura. Com base em estudos de homologia da sua sequência de nucleótidos com a de genes anteriormente caracterizados (por exemplo, por recurso à ferramenta de bioinformática BLAST da base de dados NCBI), pensa-se que o gene FLR1 de levedura codifica uma proteína localizada numa membrana celular a qual estará, eventualmente, envolvida no transporte de drogas contra as quais confere resistência na levedura, por antiporte com protões (saber mais). Este transporte pode ser ou para o exterior da célula através da membrana plasmática ou para dentro de organelos (por exemplo, do vacúolo) através das membranas que os envolvem (neste caso a membrana vacuolar) de modo a remover (ou a reduzir a concentração de) a droga dos seus alvos de acção. Assim, um resultado importante no decurso da análise funcional deste gene foi a identificação da localização sub-celular da proteína codificada. Para esse fim foi construída uma fusão genética FLR1-GFP, realizada com base num vector de clonagem (neste caso o vector pMET25_GFP; Boles E., resultados não publicados) onde está já inserido o gene codificante da GFP. A sequência codificante do gene FLR1, a que foi retirado o codão STOP, foi amplificada por PCR e clonada em fase com o gene GFP como esquematizado na figura.
Um dos problemas limitativos da aplicação desta técnica pode ocorrer
ao nível da detecção do sinal fluorescente da GFP. Para o ultrapassar,
e para a proteína de fusão possa ser produzida com níveis apreciáveis,
a fusão genética FLR1::GFP preparada encontra-se sob a acção de um promotor
forte reconhecido na levedura, neste caso o promotor regulável do gene de levedura MET25 (Mumberg et
al., 1994).
Fig. 1 - Esquema do plasmídeo replicativo na levedura contendo a fusão genética FLR1-GFP, construído para proceder à localização subcelular da proteína Flr1p em células em crescimento de S. cerevisiae.
Como descrito acima, a proteína Flr1p é um transportador transmembranar. Assim, a observação da fluorescência da proteína de fusão FLR1-GFP na periferia de células que exprimem o plasmídeo pMET25_FLR1::GFP, sugere que a localização da proteína Flr1p seja na membrana plasmática. Este resultado pode ser observado na figura (Broco N., resultados não publicados).
Fig. 2 - Localização subcelular da proteína Flr1p na membrana plasmática de S. cerevisiae. Esta localização foi detectada por recurso à expressão de uma fusão genética FLR1-GFP (B). Em (A) as células albergam apenas o plasmídeo controlo (sem a fusão genética) pelo que apenas se detecta a fluorescência basal das células.
Esta técnica tem sido usada correntemente no grupo de Ciências
Biológicas do CEBQ, IST, para proceder à localização subcelular de
vários outros novos transportadores transmembranares envolvidos no
fenómeno de resistência a múltiplas drogas na levedura, nomeadamente AZR1, AQR1, QDR1 e QDR2 (Tenreiro et
al., 2000,
2002
;
Nunes et
al., 2001
;
Vargas et
al., 2004
).
A eficiência desta técnica levou inclusive à sua aplicação em larga
escala, ou seja para localizar, tendencialmente, todas as proteínas
sintetizadas pela levedura (Huh et
al., 2003).
Os resultados dessa localização subcelular em grande escala estão disponíveis
na base de dados
Yeast
GFP Fusion Localization Database
.
As fusões GFP têm sido também utilizadas para acompanhar o tráfego intracelular
de proteínas em levedura, in vivo. É o caso da deslocação do factor
de transcrição Yap1p do citoplasma para o núcleo, em condições de stresse oxidativo
(Kuge et
al., 1997).
Outro exemplo é a utilização destas fusões para acompanhar proteínas
localizadas na membrana plasmática desde a sua síntese, tráfego e
localização na membrana plasmática, até à sua degradação, permitindo
assim identificar as vias de exocitose e de endocitose envolvidas (Paiva
et al., 2002
;
Kelm et al., 2004
).
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